A falta de cautela nas cautelares

Recente decisão do Supremo Tribunal Federal no HC 179.815, noticiada em prestigiado site jurídico do país, expôs a violência de decisões judiciais tomadas ao arrepio das cautelas necessárias quando do exame da manutenção ou não de medidas invasivas e restritivas ao réu. A falta de razoabilidade na situação ali revelada consistiu justamente na desnaturalização da função das medidas cautelares que podem ser aplicadas seja no curso da investigação criminal seja no curso do processo. 


Como o nome sugere, toda medida cautelar tem por função acautelar, proteger, resguardar algo, que, na seara criminal, pode ser a vítima, as testemunhas, a própria investigação ou processo, entendido esses últimos como passíveis de resguardo de eventual agir do réu ou investigado que possa criar obstáculos tendentes a retirar-lhes a efetividade. É lógico, portanto, que nenhuma medida cautelar criminal pode ser tomada em desfavor de nenhum cidadão que ou não responda a nenhuma investigação ou processo ou tenha sido absolvido das acusações que eventualmente tenham sido oferecidas em seu desfavor.


Seja qual for a medida cautelar imposta em desfavor do réu no processo, tendo sido ele absolvido, ela deve ser imediatamente revogada pelo Juiz. Sequer seria necessário para isso aguardar o trânsito em julgado da sentença absolutória quanto menos obrigar o réu a recorrer ao Supremo Tribunal Federal para que a coerência da sistemática das cautelares fosse respeitada.


Infelizmente, o que se vê é a lógica faltar e essa falta terminar por desconstruir a própria finalidade das medidas cautelares, transformando-as em principais e autônomas ao processo quando elas lhe são dependentes e acessórias. 


É de se perguntar se decisões como aquelas objeto do referido habeas e que chegou ao conhecimento comum pela divulgação bem promovida pela revista eletrônica Consultor Jurídico foram realmente as únicas ou são as únicas tomadas com tamanha descautela quando se tem por enfoque o binômio necessidade x prudência ou, como seria mais bem lido, necessidade x adequação das medidas judiciais.


Partindo-se do pressuposto de que medidas cautelares só podem ser decretadas quando e se o cidadão responder a processo crime ou investigação, quando a situação fática revelar a absoluta necessidade da medida e for ela a mais adequada para o caso, elegendo-se aquela que equilibre a dignidade do réu e a higidez do processo, talvez cheguemos à triste conclusão de que as desacauteladas decisões revertidas no HC 179.815 podem fazer parte não de um universo isolado, mas de um universo penosamente comum.